sexta-feira

Beleza e Glória do Mundo Nhundiaquara (1955)


                                                                                                                              


Texto de Ennio Monção Pires


A Empolgante história da terra do historiador Rocha Pombo – Os grandes estadistas, poetas, jornalistas, escritores, artistas, cientistas, militares, engenheiros, advogados, filhos daquele bi-centenário torrão – Fundado o Instituto Histórico e Geográfico de Morretes

        Pelo admirável rio paranaense viajou, em 1880, até Morretes, S. Majestade Imperial D. Pedro II – O repórter no quarto onde dormiu, duas noites, naquela cidade, o mais sábio e democrático (não obstante Imperador) de nossos governantes.



Um dos mais requintados prazeres espirituais, um dos mais sutis e esplêndidos gozos intelectuais consiste, não há dúvida, muitas vezes, em penetrarmos determinados e encantadores umbrais da História, - sobretudo desta História que, caracteristicamente nacionalista, fala dos grandes fatos e dos soberbos vultos da Pátria imensa. E não é simplesmente e exclusivamente, nos centros de estonteante progresso, nas deslumbradoras metrópoles, nas extraordinárias esferas cosmopolitas, que o espírito mergulha, maravilhado, nas cristalinas e refrescantes águas da História. Em plena hinterlândia, nas cidades adormecidas e rudes e feias, por vezes nas suas exteriores e superficiais características, mas belas, de uma emocionante e espiritualística beleza, na sua empolgante vetustez, nos séculos que lhe imprimem aspectos de uma expressividade sem par, - é nessas cidades, nimbadas da luz do tempo e da Glória, pela etérea e perenal presença de seus filhos ilustres, que temos o finíssimo, o incalculável prazer de entrar em contato com o Passado.

EM MORRETES, NO QUARTO EM QUE DORMIU D PEDRO II

            Em nossa missão jornalística e sob a imposição de variados interesses, estamos constantemente a fugir do metropolitano afalto do pisca pisca dos gigantescos luminosos da frebrieitante agitação das cadilaquonas artórias – para a magnífica placidez interiorana, para a vida silenciosa ensimesmada e anônima das pequeninas cidades (pequenas e rudes no seu primitivismo urbanístico mas admiravelmente grandes de uma singular importância, na simplicidade e na ausência de nevrosados complexos, na ausência de traumatizante preocupações de seus habitantes).

            Numa dessas constantes e recentes fugas de asha verus  da Imprensa, de ergastulado da inteligência, estivemos na bi-centenária Morretes, torrão berçal de Rocha Pombo, do simbolista Silveira Netto, do imperial estadista, Manoel Alves de Araújo, do jornalista João Rodrigo de Freitas, do internacional escultor João Turim, do Almirante Frederico de Oliveira, do engenheiro Odair Grillo, do advogado Antonio Picardi e de numerosos outros gloriosos nomes – distante, Morretes apenas duas horas e meia, via férrea, desta já Centacular Curitiba.

            E ali, naquela cidadezinha, fundada por João de Almeida, e esplêndida nos seus duzentos e vinte e dois anos de existência, - imergimos, fascinados, o espírito num Passado verdadeiramente augusto. E nos deliciamos de corpo presente com a História.

            Acontece que lá pelos idos de 1880, o Imperial D. Pedro II acompanhado de D. Tereza Caletina, subiu, de tancha o rio Nhundiaquara (então francamente navegável), até Barreiros – ou Porto de Barreiros, o primeiro porto paranaense – e dali, de bateião prosseguiu até Morretes. Chegando a Morretes (na época, Nossa Senhora do Porto dos Morretes), D. Pedro II e sua comitiva desembarcaram pelo portão de acesso da residência do senhor Joaquim Alves, grande hervateiro, e em cuja casa está atualmente instalada a Coletoria Estadual daquele município. Subiu, então, S. Majestade Imperial pela escadaria ali existente e que desce até o rio.  Vimo-la a eminentemente histórica escadaria. E temados de extraordinária emoção, estivemos naquela casa, no quarto em que dormiu D. Pedro II, hóspede que foi do Comendador Joaquim Alves.

            Presume-se, aliás, segundo a tradição oral, que D. Pedro II tenha permanecido dois dias em Nossa Senhora do Porto dos Morretes, dali prosseguindo para esta Capital, Palmeira e Ponta Grossa, fazendo este itinerário por terra, possivelmente a cavalo.



D. Pedro II na Matriz de Morretes

           

            Folheando o 3º livro de Tombo da Paróquia de Morretes , isso graças a gentileza do Padre João Camargo, vigário local, - e homem assaz inteligente e culto – tivemos oportunidade de verificar que a 4 de junho de 1880 – precisamente há setenta e cinco anos, - D. Pedro II e a imperatriz D. Tereza estiveram em visita à Igreja Matriz de Morretes. Isso confirma indubitavelmente, a presença naquele ano da presença de D. Pedro II na mais de duas vezes centenária cidade banhada pelo Nhundiaquara, importantíssimo centro d’água que mereceu este cântico soneleante de Adolfo Werneck:



Magno rio! Tal qual uma serpente

curva, fazendo curvas, a rolar,

vais confundir tua vaga transparente

à verde-escura ondulação do mar.

“ Ao contemplar-te, majestoso, a gente

de súbito se deixa arrebatar,

e – Ofélia – vais do gosto da corrente,

belos sonhos azuis a edificar.

“ Soberbo rio! Ó rio Nhundiaquara,

não creio se suplante o próprio Nilo,

sem flóreas margens, sem tua linja clara.

“ O coração semelhas com tuas águas,

ora, sonhando, a deslizar tranquilo ...

ora rugindo em convulsões de máguas!...



INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MORRETES

De tal subido valor é o acervo de pletéritas, de homens e fatos tocados de arrebatador tradicionalismo de Morretes: tão admirável, tão rica, tão substanciosa é a História daquela pequenina grande terra – que, além de outras instituições de sua imaressível vetustez, foi fundado, aliás, dia 23 de abril próximo passado, o Instituto Histórico de Morretes! Tem como presidente: Padre João Camargo, vigário da paróquia local; como vice presidente, nada menos do que um autêntico historiador, um estupendo pesquisador de tudo o que diz respeito ao Passado – o Augusto Kubash, também pertencente ao Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo e que reside no interior do município de Morretes.