sexta-feira

Theodoro de Bona






Sócio correspondente da Sociedade Brasileira de Belas Artes





Conhecia De Bona de há anos passados como pintor da paisagem.

Agora, acabo de conhecer o pintor ilustre como artista da figura humana.

Teodoro De Bona não é simplesmente uma esperança do Brasil, é um pincel inspirado, é um artista genial.

Teodoro De Bona é um sonho que se debuxa no esplendor da aurora: é uma revelação bela da vida, uma fulguração de dias próximos no fulgor da evolução.

De há muito eu esperava pelo aparecimento da sua estrela. De há muito eu esperava pelo seu triunfo, pela vitória final da beleza do seu sentimento.

O seu devotamento à carreira das artes até o sacrifício extremo era sintomático de seu temperamento de grande artista e o astro maior do céu de uma grande memória.

Se fora vivo, Alfredo Andersen devia sentir-se ufano da glória de hoje e da fama de amanhã do seu antigo discípulo.

Já antes de sua viagem à Itália, De Bona pintava a natureza com alma, destacando-se com a lembrança de sua arte de ontem,, entre outras, as telas “ Terra Natal” e “ Águas Poéticas do Nhundiaquara”.

Poucas telas encontrei no atelier de De Bona, pois o grosso de suas habilidade artísticas está em São Paulo.

Como um cabo de guerra, que vai ao combate, ele pensa de ter mandado para a frente de sua habilidade interessante a obra primeira dos encômios de sua mocidade gloriosa, mas certo, por cá ele deixou pedaços de sua alma, que a minha alma falaram com eloquência e ardor.

Vim, vi e senti como tanto esperava, um grande talento de pintor da figura humana.

De Bona é um dos maiores talentos da geração nova de pintores ilustres do Brasil.

Sua técnica é toda sua: é sua personalidade.

Sua sensibilidade de esteta da vida, do sentimento e da alma é servida por uma sensacional delicadeza nervosa.

Não fora sua sensibilidade de extrema delicadeza, ele seria provavelmente um trágico desequilibrado.

A arte de De Bona revela o espírito da própria natureza: é a arte do ser oculto, que se revela nos frêmitos da aurora.

Há tanta sensação, há tanta vida, há tanta vibração luminosa no auto retrato de De Bona que eu senti como que transparente! Nessa arte, sua influência do sexto sentido, do sentido etéreo, do sentido da intuição.

 A tela “ Paraíso Perdido” que foi adquirida oficialmente para a galeria da Escola das Belas Artes do Rio de Janeiro para a Pinacoteca Nacional, e calcada nesta mesma técnica.

É de ver como De Bona soube pintar o homem e como soube pintar a mulher na empolgante tela do “Paraíso Perdido”.

Nesta empolgante obra de arte, Adão é realmente pintado como um macho, forte, musculoso, vibrátil, palpitante de energia e tão feito de nervos. Que parece querer erguer-se na sensação do fenômeno da percepção vertical do senso de vida. Ao passo que Eva era pintada como carne suave, como carne sentimental, como carne de sensação lisa, sem vibração exterior dos músculos, como carne – suspiro.

A figura do macho é de força; a da fêmea de doçura: uma é alma vibrante, a outra é coração e poesia.

O conjunto das suas figuras dá a impressão de harmonia do ser ao ser unido, como a realidade do homem e sensibilidade da mulher, como sentido único da audácia do macho conjugada à timidez da fêmea.

A arte de De Bona é assim, uma possibilidade de interpretação da beleza humana, do ser e da vida.

Não tive oportunidade de ver um retrato de Turim executado pelo pincel de De Bona. Viaro, que é um auto-retrato crítico e que tem senso crítico, diz que, entre todas as obras de De Bona, que ele viu, essa é a melhor, a de acabamento mais perfeito.

 Turim, o mestre do cinzel, diz que seu retrato é uma obra-prima.

Pelo pequeno esboço da cabeça de Turim, que eu tanto senti e admirei, eu posso calcular o que seja esse retrato.

Esse esboço é admirável e comovente; creio que só uma pessoa sem sensibilidade deixaria de sentir nesse trabalho o semblante e a própria feição de Turim, desse eminente Turim de quem as gerações guardarão memória e veneração.

Não quero e não posso terminar essa crônica, sem falar em um amplo esboço de um nu artístico, que De Bona ainda não terminou.

É tão grandioso esse esboço de nu artístico, que não havia necessidade de executá-lo, pois, já é uma preciosidade de arte na qual podia De Bona, esperar a transmissão de seu renome à posteridade.

Meu ser comoveu-se todo na contemplação dessa obra de arte tão chei de espontaneidade quanto de simplicidade magnífica.

A mulher que serviu de modelo era feia. Entretanto, pintada é bela. Essa pintura é altamente espiritual, é uma tela de humana pureza.

A referida tela tem tanta atmosfera, tanta alma, tanta vibração, tanta emoção espiritual, tanto encanto, tanta beleza, que revela o poder da fascinação do homem diante da vida, da alma e da poesia grandiosa da natureza humana.

Teodoro De Bona é o artista de uma tendência científico-emotiva de manifestação espiritual do ser.



Texto de Lindolfo Barbosa Lima – Outubro de 1939